Vampiros e bruxas em clássicos literários
por Rober Pinheiro em setembro 22, 2010Zero Comentários =( Publicado em Livros, Redutos
A lista de clássicos obrigatórios da literatura nacional acaba de ganhar um reforço inesperado. Aliás, mais do que reforço, uma releitura bastante peculiar.
Seguindo a onda que começou nos Estados Unidos com o lançamento de “Orgulho, Preconceito e Zumbis”, versão com mortos-vivos do clássico de Jane Austin escrito por Seth Grahame-Smith e “Razão, Sensibilidade e os Monstros Marinhos”, de Ben H. Winter, a Editora LeYa, através do selo Lua de Papel, acaba de anunciar o lançamento de quatro mashups nacionais, misturando mortos-vivos, vampiros, bruxas e criaturas alienígenas às letras tradicionais de romancistas do porte de Machado de Assis e José de Alencar.
O Bruxo do Cosme Velho, aliás, é a grande estrela desta lista de “novos clássicos”. Entre as obras machadianas que serviram de alvo para as “intervenções fantásticas”, estão Dom Casmurro — que ganhou o intrigante complemento e os Discos Voadores —, “O Alienista”, que virou Caçador de Mutantes, e Senhora, chamada agora de a Bruxa!
A nova versão de Dom Casmurro, fruto da “parceria” entre os escritores Machado de Assis e Lúcio Manfredi, traz uma nova visão sobre a conturbada história de Bentinho e Capitu. A trama romântica agora sofre a interferência de seres alienígenas e androides disfarçados sob os personagens originais de Machado. Bentinho já não é apenas a parte supostamente traída de um triângulo amoroso, e sim alguém que está numa disputa de forças intergalácticas, um combate entre as evoluídas civilizações reptiliana e aquática que habitam o planeta Terra há milhões de anos.
O autor, que já passeou pela ficção científica nas antologias “Como era Gostosa Minha Alienígena”, “Dez Contos de Terror” e “Galeria do Sobrenatural”, além de ter atuado como colaborador das minisséries “A Casa das Sete Mulheres” e nas novelas “Como Uma Onda” e “Ciranda de Pedra”, na Rede Globo, também dá um novo sentido aos olhos de ressaca de Capitu. Agora, eles têm uma ligação direta com o mar.
Outro que não escapou das adaptações foi o clássico dos clássicos “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. A história do defunto autor ganhou mais algumas letras em “Memórias Desmortas de Brás Cubas”, escrita por Pedro Vieira. Espécie de “continuação” da obra machadiana — portanto, diferente das demais por não se tratar propriamente de um mashup — a obra, lançada pela Tarja Editorial, traz Brás Cubas narrando os fatos após sua morte, quando escapou de seu caixão, espalhando o caos pelo Rio de Janeiro.
“A Escrava Isaura”, romance de Bernardo Guimarães, em sua versão fantástica, se transformou em uma história recheada de sugadores de sangue no sugestivo “A Escrava Isaura e o Vampiro”, de Jovane Nunes, ator da Cia de Comédia Os Melhores do Mundo.
Com um humor bastante peculiar, o livro [re]conta a história de Isaura, uma escrava que se vê cercada por estranhas criaturas mortas-vivas — além de ávidas por um bom gole de sangue — por todo lado. Destaque de ambos os livros, nesta história o vilão Leôncio assume ares de um vampiro bastante atrapalhado.
O cearense José de Alencar também não escapou a essa reinvenção fantástica. Seu livro “Senhora” recebeu elementos sobrenaturais e misteriosas feiticeiras celtas e se transformou em “Senhora, a Bruxa”, pelas letras de Angélica Lopes.
Nesta nova versão do romance clássico de 1875, o folhetim de época vira uma trama sobrenatural, com elementos de magia e bruxaria. A vingança de Aurélia contra o ex-namorado agora é elaborada com a ajuda das misteriosas irmãs Blair — feiticeiras celtas em busca de vida eterna, que há mais de trezentos anos semeiam a discórdia entre os pobres casais apaixonados.
Fechando a lista de mashups, “O Alienista Caçador de Mutantes”, de Natalia Klein, revisita um dos contos mais famosos de Machado de Assis, que soma irreverência e nonsense ao humor ácido e politicamente incorreto do escritor carioca do século XIX.
A vila de Itaguaí é alarmada pela queda de uma nave espacial e por uma névoa que causa mutações alienígenas. Quem cuidará do estranho caso é Simão Bacamarte, médico que recebeu do povo a alcunha de alienista, uma combinação dos termos alien e especialista.
Como era de se esperar, o anúncio dos Clássicos Fantásticos causou reações as mais diversas entre os literatos e acadêmicos de plantão. Muitos, inclusive, acusando os autores de serem responsáveis pela derrocada da literatura nacional.
Exageros à parte, os livros seguem uma tendência, se não controversa, ao menos bastante ousada, tornando-se uma maneira interessante de aproximar a literatura clássica da fantasia contemporânea.
O lançamento dos quatro volumes acontece dia 22/09, quarta-feira, na Loja de Artes da Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo.