Peer Gynt
por Rangel Andrade em julho 15, 2010Um Comentário Publicado em Teatro
Sófocles escreveu no prefácio de Édipo Rei que não devemos considerar feliz nenhum ser humano, enquanto ele não tiver atingido, sem sofrer os golpes da fatalidade o termo de sua vidá.
Séculos mais tarde Henrik Ibsen criou Peer Gynt um jovem sonhador, predestinado a lutar por seus objetivos, valendo-se de uma certa falta de moral para chegar a conquista de seus sonhos. Filho de uma simples dona de casa, o camponês sonha em conquistar o mundo. Caprichoso e irresponsável, tem um excelente conceito de si mesmo e se horroriza com a possibilidade de perder a preciosa identidade que acredita ter. Peer acaba sendo banido de sua aldeia natal e aventura-se pelos cinco continentes passando por lendas nórticas, como os trols, e chegando até o sonhado eldorado: Egito.
O personagem acaba deixando para trás o amor de sua vida, a doce Solveig, para cruzar o mundo em busca de poder e dinheiro, mas acaba descobrindo que a única pessoa que ele precisa descobrir e aceitar é ele mesmo. Passa de um jovem sonhador e destemido a um senhor arrogante, rico e que se acha o dono de tudo a sua volta. Ao ser obrigado a voltar para casa ele acaba encontrando em seu caminho a morte que lhe faz uma proposta: só não o levará com ela se ele conseguir o testemunho de alguém que prove que ele existe de verdade. Peer começa uma busca por sua identidade, reencontra alguns inimigos, revive alguns erros e sem escolha e arrependido volta para pedir desculpas a Solveig e redescobre nela o que lhe faltava para viver: o amor ao próximo.
Ibsen ali fazia uma crítica à postura do homem norueguês, a um modo de agir e pensar que o entristeciam profundamente, já em 1867 o autor fazia uma prévia do que seria o homem moderno dominado pela arrogância e vontade de ter sempre mais. As pessoas que cruzam com Peer Gynt são ao mesmo tempo suas vítimas e seus algozes, o personagem é julgado o tempo todo por seus atos, deixando uma clara lição sobre os limites que devemos ter em nossa vida.
O texto é encenado este ano pela turma de formandos do Tablado, jovens atores que conseguem dar um colorido especial e poético ao texto. O que mais surpreende em uma turma de formandos é a garra com que todos abraçam o projeto e a forma e força com que levam o trabalho para o palco.
A direção de Guida Viana, também não deixa a desejar, ela consegue entender a mente dos atores e fazer com que levem para cena um texto, que trás em si um certo peso pelo nome do autor, de forma leve e natural. E é bonito ver como o texto flui e como passa pelos atores transformado-os e voltando ao público suave e belo, como é a mente de um jovem sonhador.
Algumas cenas, definitivamente, merecem um destaque como: a cena em Peer narra uma história para sua mãe enquanto ela morre, toda a sequencia dos trols (aqui o destaque vai para os atores que fazem os monstrinhos e não tem falas, surpreendentes!), a cena de Peer com o Demônio no segundo ato é surpreendente pela atuação do ator que da vida ao ́capetudó( não consegui o nome dele, mas ainda assim meus parabéns, pela construção de uma figura assexuada e pela sua segurança em cena) e uma cena pequena, mas muito bem dirigida e entendida pelas atrizes é aquela em que três meninas vão atrás dos duendes para se entregarem a ele e acabam dormindo com Peer, é uma cena simples e curta, mas a interação entre as atrizes, o jogo de cena e humildade em entrar no tempo do outro ator é demais.
A direção musical fica por conta do jovem cineasta Matheus Souza (duas vezes premiado no Festival do Rio, em 2008, pelo filme Apenas o Fim), que inclui sucessos das bandas Beirut, Radiohead, The Strokes, Belle and Sebastian e da cantora Regina Spektor. Batidas modernas que só tem a acrescentar na beleza do texto, a simplicidade dos atores e a direção coesa de Guida, que mais do que dirigir entende as necessidades que aquele grupo de atores requer e consegue dialogar em com sua equipe criando um belo espetáculo.
Serviço
PEER GYNT, de Ibsen.(110min) Direção de Guida Vianna.
Teatro Tablado (Av: Lineu de Paula Machado 795 – Lagoa, Rio de Janeiro) 150 lugares
Tels: /
Sábados, às 21h e Domingos, às 20h.
Ingressos : R$ 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (meia)
Até dia 01/08
FICHA TÉCNICA:
Texto: Henrik Ibsen
Tradução: Leo Gilson Ribeiro
Diretor Assistente: Matheus Souza
Produção: Luana Manuel e Carol Vilela
Assistente de produção: Carolina Caetano
Trilha Sonora: Matheus Souza
Sonoplastia/ Efeitos especiais: Lincoln Vargas
Canção de Solveig: Lincoln Vargas
Iluminação: Rodrigo Belay
Assistente de Iluminação: André Pellegrino e Rodrigo Miranda
Direção de Arte: Guilherme Cavalcanti
Equipe de Arte: Traquitanas
Figurino: Luiza Moura
Programação Visual: Luana Manuel
Divulgação: Carol Vilela e Radha Barcelos
Administração/Bilheteria: Zeli de Oliveira
Adaptação, concepção e direção: Guida Vianna
ELENCO:
Adriano Martins
Alexandre Duvivier
Anita Chaves
Antonio Baines
Carol Vilela
Clarissa Pacheco
Diego Reishoffer
Erika Scheiner
Hugo Maia
João Sant’Anna
Jorge Elali
Karina Ramil
Karine Coelho
Luana Lima
Luana Manuel
Luis Fernando Bruno
Maria Antônia
Rachel Rennhack
Radha Barcelos
Thiago Carvalho
Vicentina Novelli
Zé Helou