Sonhos Roubados

O cinema brasileiro durante algum tempo se focou nas favelas cariocas em filmes violentos, como Cidade de Deus (2002, Fernando Meirelles) e Tropa de Elite (2007, José Padilha), merecedores e ganhadores de prêmios, mas um pouco pessimista no modo de tratar do assunto. Tivemos também excelentes experiências como o maravilhoso Central do Brasil (1998, Walter Salles), apesar de não ser “favela” é o retrato de uma população mais pobre e menos favorecida, mas extremamente positivista ao falar do relacionamento entre uma senhora e um menino.

Em 2010 desembarcamos numa favela carioca, onde o tráfico impera, adolescentes são molestadas em casa, outras se entregam prostituição, mães solteiras, fé cega em uma religião opressora, miséria, fome e sonhos. Sonhos roubados, endurecidos, esquecidos, mas sempre sonhos. Mais um enredo repetido no cinema brasileiro? NÃO.

Sonhos roubados, não é um filme engajado, moralista ou defensor da causa dos oprimidos; é acima de tudo uma história de meninas e sonhos, que em algum momento podem ser pequenos, como o mp3 ou a calça da Gang, mas sempre sonhos. Sandra acertou a mão em não colocar a prostituição como tema central, mas sim como pano de fundo para nos apresentar três amigas que se descobrem mulheres e passam a definir suas escolhas a partir de seus erros e acertos.

O filme é permeado pelo oposto: sensibilidade e dureza. As meninas não são colocadas como coitadas ou vítimas da sociedade, elas têm consciência do que fazem e por que fazem. Essa secura chega a assustar um pouco, mas nos fazem enxergar esses indivíduos que em algum momento se tornaram invisíveis para sociedade: tão cheia de falsas morais e sedenta por satisfações passageiras e rápidas.

Mas no meio de todo esse tormento aparece uma luz: Dolores (Marieta Excelente Severo), uma cabeleireira solitária que conhece por acaso Daiane (Amanda Diniz), ligadas por uma amizade forte e marcante as duas acabam tendo suas vidas transformadas. Daiane começa a se interessar pela profissão, luta pela dignidade ao denunciar o tio pedófilo e por escada acaba influenciando as amigas Jéssica (Nanda Costa) e Sabrina (Kika Farias).

O livro “As Meninas da Esquina – Diário dos Sonhos, Dores e Aventuras de Seis Adolescentes no Brasil”, de Eliane Trindade, serviu de base para Sonhos Roubados. A opção por focar o filme em três personagens, ao invés das seis do livro, foi para que a história não ficasse muito diluída. O filme ganhou os prêmios de melhor filme júri popular no Festival do Rio 2009 e melhor atriz para Nanda Costa.

Um excelente filme em um excelente momento do cinema brasileiro. Onde tantos artistas novos têm a oportunidade de mostrar de seu trabalho e talento. Merece ser visto e ser elogiado, Sandra se mostra mais madura ao tratar com segurança e sem ser chata ou moralista um assunto difícil. Sonhos roubados é a melhor estréia brasileira de 2010.

Dados Técnicos

Título Original: Sonhos Roubados
Gênero: Drama
Duração: 01 hs 25 min
Ano de Lançamento: 2010
Site Oficial: http://www.cineluz.com.br/sonhosroubados/
Estúdio: Cineluz / Estúdios Mega / Labocine
Distribuidora: Europa Filmes
Direção: Sandra Werneck
Roteiro: Paulo Halm, Michelle Franz, Adriana Falcão, Sandra Werneck, José Joffily e Maurício O. Dias, baseado em Livro de Eliane Trindade
Produção: Sandra Werneck

Rangel Andrade

Ator e fundador da ESS N.CIA, cia de teatro.

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