“Batman – O Cavaleiro das Trevas”
por Bruno Accioly em julho 22, 20084 Comentários Publicado em Cinema, Destaque
Certa vez houve um quadrinho muito especial, chamado “O Cavaleiro das Trevas”, e os puristas podem ter torcido o nariz para o nome dado a este novo filme, do personagem que alguns já amavam nos quadrinhos e que muitos até estão estranhando por conhecerem apenas das telas de TV, da série da década de 60.
Quando das filmagens em Chicago, em abril de 2007, a produção teve de disfarçar o filme sob o título “Rory’s First Kiss”, usando de material de marketing forjado e tudo mais que se pode imaginar. Pudera! O filme precisava mesmo de toda a discrição que pudesse ser obtida!
“Batman – O Cavaleiro das Trevas”, embora não seja tão grandiloqüênte quanto o seu homônimo nos quadrinhos, é uma obra extremamente bem fechada, consistente, bem escrita e que faz bonito nas telas ao falar de Moral, Ética e Natureza Humana sem medo de quebrar alguns ovos.
O Coringa não é mais um vilão apenas engraçado e louco, mas um arauto do caos com visão política relevante e bem definida, cuja existência se deveu a impossibilidade do mal se manifestar sem ser espatifado pelo Homem-Morcego, quase onipresente na problemática cidade de Gothan.
Harvey Dent não é mais apenas frágil, mas um idealista frustrado que, como todos os idealistas frustrados e pouco insistentes, se torna um cínico contra tudo o que ele mesmo sempre pregou e representou. É a manifestação do quanto, por vezes, a perda pessoal fala mais alto que os princípios e a ideologia.
A máxima de que “Morre-se herói ou vive-se o bastante para ver-se transformar em vilão” é levadas às últimas conseqüências e não sem aviso.
Toda sorte de questão moral relacionada com o nosso tempo vem a tona através da alegoria que é Batman, a polícia daquele pequeno mundo, que aterroriza tanto os inimigos daquela cidade que, em dado momento, surge um inimigo a altura, causando tanto terror quanto ele mesmo.
E mesmo torcendo por Batman, nos questionamos acerca de seu direito em combater o crime, para além das leis, reacionário em essência e çom métodos que vão de encontro às leis da cidade.
Christopher Nolan nos leva por uma viagem pelo pensamento grego e pela criação da Filosofia do Direito, não perdendo de vista a importância dos personagens mas não se furtando a colocá-los em cheque o tempo todo com questões que tem mais de 2500 anos de idade.
Christian Bale está ainda mais assustador e a caminho de um futuro cada vez mais soturno como Bruce Wayne; Aaron Eckhart vive Harvey Dent, um herói possível, aquele que tem seus deslizes e limites, mas que é tudo o que Wayne gostaria que fosse suficiente; Maggie Gyllenhaal é uma escolha mais razoável e que dá mais credibilidade a Rachel Dawes; Gary Oldman empresta uma dignidade sem fim no papel de um íntegro e incansável comissário Gordon; Morgan Freeman e Michael Caine, vivendo Lucius Fox e Alfred fazem as vezes da consciência do “patrão Bruce”, fazendo algumas das colocações mais austeras e perversas, cada qual a seu tempo. Trata-se de um elenco invejável para qualquer adaptação de quadrinhos!
E há ainda Heath Ledger, o Coringa, conseguiu encarnar o personagem com competência maior que todos os seus notórios predecessores e levá-lo a um outro nível, em uma memorável performance digna de um Oscar póstumo – somente um outro Coringa, menos conhecido, visto em “Batman Dead End” (a melhor adaptação dos personagens até “Batman Begins”, em minha opinião), chega perto do desempenho de Ledger .
Cada vez mais vemos os quadrinhos como manancial de boas histórias, além claro, de grande diversão, agora que a tecnologia assim permite e que não só diretores e atores, mas o público começa a levar a sério tudo o que antigamente era nerd.
É importante entender que os super-heróis são uma classe de personagens cujas histórias vêm sendo contadas há décadas e que já foram mais que testados por seus leitores. Repaginar estes personagens e suas histórias, para o cinema, é algo tentado há mais de dez anos e que finalmente começa a ser feito de forma competente. Trata-se de um campo fértil para se contar histórias, uma vez que poucos personagens da literatura foram mais consistente e insistentemente definidos e revisitados que os super-heróis.
Vale ver quem andou falando a respeito de “Batman – O Cavaleiro das Trevas” para entender, dos grandes ou dos , em quanto este filme foi importante na histórias das – tenha o espectador gostado ou não.
Se você ainda não viu “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, sugiro que corra até o cinema, pois o ingresso está custando uma bagatela, tendo em vista os 152 minutos de filme!
E, como diziam os cartazes, “Bem vindo a um mundo sem regras!”… Bem vindo ao nosso mundo!