Naná Hayne e as “TecnoJóias”

Naná Hayne é de Mairiporã, São Paulo, é artista plástica e artesã de jóias muito especiais que denomina “TecnoJóias”.

Trabalhando com lixo-digital, o OutraCoisa foi atrás dela para que nos concedesse uma entrevista sobre seu trabalho e sobre as palestras que ministra sobre a conscientização acerca de nosso impacto no meio ambiente e nossa real condição de evitar problemas mais sérios no futuro.

Nome: Naná Hayne
e-mail: nana_hayne(arroba)hotmail.com
MSN: nana_hayne(arroba)hotmail.com
ICQ:52629974
Flickr:
Blog: http://nanahaynearte.blogspot.com/
Orkut:
Na media: Naná Hayne no G1

OutraCoisa: O que são TecnoJóias?

São as bijouterias feitas com o lixo digital, assim como existem as EcoJóias, coloquei eu mesma o nome “TecnoJóias”, por serem oriundas do lixo digital/tecnológico.

OutraCoisa: Quando você teve a idéia de trabalhar com lixo digital?

Minha impressora e PC quebraram e eu, num ataque de raiva, dei um puxão no cabo da impressora, ele se rompeu e vi pela primeira vez o que tinha dentro… “fios coloridos”. Aí, abri também o PC, vi a placa-mãe e pensei “gente, parece Brasília” e ali aconteceu a “paixão”.

Isso aconteceu há cinco anos, e foi o meu despertar de para a reutilização do lixo digital. O que era algo estragado e sem valor virou, uma nova inspiração.

A partir daí, eu comecei a pesquisar componentes eletrônicos e examinar os materiais da indústria de tecnologia. As pessoas não percebem o valor que existe no que consideram apenas porcaria, lixo, sem função. Sim é sem função, mas não se pode esquecer que é sem função para o que foi criado. Não parei mais de trabalhar com essa visão de transformação, reaproveitamento, combate ao desperdício e, mais importante, a conscientização. Meu interesse é encontrar apoio das empresas de tecnologia, elas precisam acordar para isso! O discurso comum é preparar as crianças para um futuro melhor, mas podemos todos, começar isso agora!

OutraCoisa: Você já trabalhava com este tipo de matéria prima antes?

Não.

OutraCoisa: Cada peça é única ou você tenta reproduzir modelos que fazem mais sucesso?

Cada peça é única. Às vezes se alguém pede, tento reproduzir algo, mas é complexo, prefiro sempre fazer algo novo, a criatividade é imensa pois, o material possibilita isso cada fabricante opta por um tipo diferente de acabamento nos componentes e existem tantas coisas que o legal é criar.

OutraCoisa: Quem são seus clientes? Você consegue traçar um perfil?

Acredito que o perfil seria de gente preocupada com o meio ambiente. Nerds e geeks, também, porque conhecem e curtem tudo da tecnologia, mas a difusão do meu trabalho é ainda pequena, assim, nem todos sabem que existe, então as vendas estão ainda difíceis. Eu estou conseguindo um bom mercado, fora do país, porque meu namorado é italiano e colocou à venda em seu bar, onde tem também exposições, música ao vivo e um espaço para conexão à internet e a maior frequência é de pessoas ligadas às artes e intelectuais. Talvez eu
possa me dar bem mesmo em propostas de eventos específicos da área de
tecnologia ou ações relacionadas a isso. Aí sim, poderei sem dúvida
fazer algo inusitado!!

OutraCoisa: Que outras peças você faz além de adornos pessoais?

Telas, esculturas e decoração, seja em stands, residências, escritórios ou “home office”.

OutraCoisa: Você revisita obras de pintores e escultores?

Pintores principalmente, outro dia fiz uma série que intitulei de “Kandinsky”.

OutraCoisa: Trabalhar com lixo digital mudou sua forma de engajar na questão ambiental?

Existe algo em mim, aprendido, desde a infância com minha avó materna, que me ensinou 2 dos 3 R’s, com exemplos práticos. Ela era costureira, viúva e muito pobre, criou seus 5 filhos com o princípio, Reutilizar!

Eu digo que foram 2 dos 3 R’s, porque acredito que quando se Reutiliza, na verdade você está também Reduzindo o lixo. Então a questão ambiental, sempre fez parte da minha educação. O terceiro R que é de reciclar, eu coloco como ultima alternativa, quando não foi possível reutilizar.

OutraCoisa: Você acredita no poder da arte como modificador do comportamento do Homem em relação ao planeta? Por que?

Acredito piamente!

Um dos conceitos que mais gosto de arte é este:

“Arte é simplesmente a concretização de um sentimento.”

Ora, uma vez que expresso e levo a outrem a possibilidade de “concretizar” seu sentimento, é possível que mil outras maneiras surjam a partir daí, talvez eu seja muito otimista, mas creio que tem muito mais gente querendo expressar o amor ao planeta que o contrário. Só não sabem como!

E depois, já se tornou uma condição e não uma opção, ou se faz algo, ou simplesmente não vai mais existir.

OutraCoisa: Você tem Blog MSN, Orkut, Twitter, Flickr… Trabalhar com PCTrash promoveu a inclusão do mundo digital na sua vida?

Não.

Eu sou atípica em relação à maioria da minha geração. Tenho 50 anos e meu primeiro computador foi um 286 “que era o máximo em tecnologia da época” conheci e usava o que, digamos foi o avô do chat, o video papo, uma ferramenta do video texto, um serviço da antiga TELESP, quando nem existia a internet.

Sempre fui apaixonada pela tecnologia e informática. A possibilidade latente de se “poder sempre mais”, (leia-se este “poder”, como maiores possibilidades de conhecimentos) se “obter muito mais” (leia-se este “obter”, como conseguir comunicação) é algo que simplesmente faz “viajar” minha cabeça!

Quando chegou a internet, eu ficava horas em chats e meu ICQ estava aberto enquanto o pc estivesse ligado.

Buscando entender mais e mais, sobre como funcionava as telecomunicações, trabalhei como executiva de contas em uma agência de propaganda voltada somente à Tecnologia e Informática. E na TELEXPO de 2001, consegui o primeiro cliente internacional da agência, a CMG Telecom, desenvolvedora de soluções, dizia algumas revistas da época:

“CMG Telecom – apresenta sistema Wap para Banda C – transmissão via celular para determinada área geográfica – e bilhetagem para telefonia sem fio. Além de mostrar novas oportunidades de negócios de mensagens curtas para bandas A/B/C; mensagens em dois sentidos (correio eletrônico por celular) e Wap Banda A e B.”

Ou seja, quando o Brasil iniciou as operações via SMS, lá estava eu ;) e fui uma das primeiras a testá-la.

Na época a briga pelo mercado estava formada, como pode ser lido aqui

OutraCoisa: Nerds foram o motor de toda a indústria da qual vem a matéria prima de suas obras. Qual sua relação com a cultura Nerd?

Eu acho complexa esta “idéia” que se tem sobre quem sabe o que e onde, ou fazer para este e não para aquele.

Catalogar, tagear, rotular, faz grande parte de uma bela confusão!

Não posso dizer que viver sem nomenclatura é o ideal, ou que lacunas e ‘nichos’ de mercado não existam. Não sou suficientemente estúpida, para dizer isto. Mas acho que atrapalha em alguns casos, questões como: “nomes&definições.”

Óbvio que se torna difícil vender gelo prá esquimó e fácil vender para um tuareg.

Mas a qual “tribo” pertenço?

Eu penso que a nenhuma, mas muitos diriam:

Uma “tiazona” querendo se infiltrar na cultura Nerd?

É complicado, não é mesmo?

No entanto, faço o que possivelmente agradará muito mais a um nerd que a um, “não-nerd”, se é que posso dizer assim.

Tenho uma preocupação de forma mais “genérica”.

Tem pessoas que olham o que faço, apreciam, compram e não imaginam qual foi o material usado, muito menos qual o trabalho feito para que eu chegasse ali. Quando explico, muitas vezes ouço: “Nossa, mas um computador tem tanta coisa bonita assim por dentro?”

Não vou me incomodar pela falta de conhecimento desta pessoa, vou somente agradecer a compra e saber, que ao menos, através do meu trabalho, ela já sabe que é possivel se fazer algo com o lixo digital.

Quero dizer também que se tiver oportunidade dentro da cultura Nerd, claro, será um prazer conhecer mais.

OutraCoisa: Existe grande potencial para seu trabalho em Cosplay, SteamPunk e outros movimentos derivados da Cultura Nerd. Pretende fazer algo neste campo?

Eu busco oportunidades de trabalho. Assim sendo, todos os movimentos , derivados e culturas me interessam. Às vezes o complexo é conseguir entrar em tais campos.

O fato de considerar-se spam, quase tudo o que é, somente ainda pouco conhecido, dificulta o contato, creio.

Prá você ter uma idéia no Orkut, por exemplo, entrei para algumas comunidades, com esta finalidade, mostrar o trabalho e colher opiniões. Uma delas me deletou, outras sequer leram o tópico. Eu me pergunto, e perguntei também por lá (foi aí que me deletaram, rs) como mostrar algo que provavelmente irá interessar à vocês, se não dão nem um simples “click” pra saber (antes de deletar) do que se trata?

Eu ficarei super feliz de ter acesso à tudo pertinente ao meu trabalho e muito grata se tiver possibilidades de trabalhar para quem gosta do que faço.

Abaixo a resposta, que também postei em outra comunidade, nesta segunda está lá, mas ainda sem nenhuma resposta, o que me leva a questionar: Foi lido?

OutraCoisa: Vc acha que isto é auto promoção?

Coloquei um tópico, numa outra comunidade Geek…falando do trabalho que faço.
Coisa que acredito seja interessantíssimo, para quem está tão ligado à tecnologia!!!
E por ser um trabalho INÉDITO no mundo!

TRABALHO COM O LIXO DIGITAL/TECNOLÓGICO…EM ARTE E ARTESANATO

Afinal, é preciso alguém pensar no que será feito com montanhas de lixos que já estão formadas, ao redor do mundo, quando uma placa, processador, hd, bateria, etc e tal do nosso computador queima e não vai mais nos servir!

Ao que me parece foi retirado, por ter sido considerado auto promoção / divulgação !

Eu pergunto: Acreditam “messssmo” que o assunto não está relacionado, com a comunidade?

Eu NÃO faço um trabalho como MILHARES de pessoas fazem!

Ou quem é que já viu um chaveiro de placa de CI (Circuito Integrado), colares de componentes de hd, anéis, pulseiras, telas, esculturas, decorações… com chips, placas, diskets, teclados, fusíveis, cabos, engrenagens de impressoras, flops, processadores, etc, etc ,etc………………………………

Não mostrar meu trabalho à uma comunidade Geek, (que seria uma das maiores conhecedoras de tecnologia e portanto consciente do lixo tecnológico), é o mesmo que dizer que existe a internet mas que não poderão usá-la!

…mas é isso aeeeeeeeeee, quando um “gringo” copiar minha idéia… vai ter gente pagando em dolar!!!

Abraço!

Sim, tem gente que trabalha com o lixo digital, mas da maneira como trabalho ainda não.

OutraCoisa: Você vê espaço para seu trabalho em meio ao público Nerd?

Sim vejo, assim como ao público Geek, que em verdade, difundirão, com maior facilidade ao público comum.

Mas, “acesso” , como já mencionado é que são elas.

Isto que falei acima, não ocorre somente ali no orkut, eu já busquei contato com revistas especializadas em tecnologia, cultura Nerd e Geek, assim como outros meios de comunicação como tv e jornais… mas, acredito que meus e-mails nem chegaram à redação!

Como não pensar assim diante deste fato? Vale a pena ler isso aqui

OutraCoisa: Sobre o que você fala em suas palestras?

Eu diria que meu objetivo é fazer pensar…

Procuro falar da importância em mudar nosso prisma de visão para o lixo de forma geral.

Não importa com o que se trabalhe, o que importa é, se existe o ser vivo, logo existirá, descarte, lixo, então não esperemos por um “milagre”, foquemos nossos olhares de maneira diferenciada, pois segundo o que penso a mudança só ocorrerá quando nos conscientizarmos disto. É o modo como se olha para o lixo que faz toda a diferença!

O conceito é que deve ser trabalhado e mudado, reforço o que acredito ser o mais importante dos 3 R’s, a reutilização, busco ser abrangente e dar exemplos práticos, pois, se numa destas palestras houver uma dona de casa, por exemplo, sairá dali feliz e pensando em como pode fazer mais, com um exemplo prático: “Na sua cozinha a senhora faz isso todo o tempo mas nunca pensou a respeito”

Geralmente cito esta frase, para fazer pensar, levar ao cotidiano é uma das maneiras mais fáceis de se conseguir integração, creio.

Ora, qualquer um sabe que, sobras de frango por exemplo, podem virar bolinhos, salpicão, tortas, sopas e etc

No caso de um músico…

O ultimo trabalho da Fernanda Takai o que é?

Reutilização!

Ela reutiliza as canções de Nara Leão, colocando arranjos novos.

No caso de um médico…

Transplantes são o que?

Reutilização!

Estes exemplos fazem parte de nosso cotidiano, mas não mais pensamos à respeito, justo pelo fator, “ter se tornado comum”.

Então porque não passar tal hábito à outras partes da vida?

Isto serve para todos.

Cito alguns dados que recolho em revistas, jornais e outros, sobre os males que pode causar tal lixo, se descartado de maneira errada.

Aqui abro espaço, para falar da importância do saber e a pouca informação existente, já escrevi para algumas pessoas que assinaram matérias sobre isso, pedindo maiores informações no manuseio deste lixo, uma vez que é tóxico, porém nada de respostas, já escrevi para fabricantes também e nada. Tomo medidas preventivas me baseando no lido e aprendido até mesmo sobre outros materiais tóxicos, usar luvas, máscaras, não aquecer, etc, tenho também o cuidado de resinar, para que seja “selado”, mas tenho muitas dúvidas ainda e não encontro quem me auxilie nisto. Por exemplo, eu corto e lixo placas de ci, e o pó formado em contato com a minha pele, que mal pode causar?

Busco conscientizar, cada pessoa presente, de que ela também é responsável nesta luta, que não pense que é algo onde ela não pode fazer nada. Coisa que, me serve, na pós-palestra, pelo que esta pessoa, poderá levar a outros.

OutraCoisa: Que tipo de instituição a procura para ministrá-las?

Eu ministrei poucas palestras ainda e estas foram em Escolas, Ong’s e no evento Campus Party.

OutraCoisa: Em sua opinião, qual a função da Arte em um mundo voltado para o Entretenimento e Consumismo?

Eu acho que dentre o entretenimento e o consumismo, vive também a arte. Arte, não é algo isolado do contexto geral, ao contrário é inserido em todos eles. Mas a idéia da arte ser elitizada, faz pensar o contrário. Ainda que seja a arte comercial, ela está lá, numa embalagem, num cartaz, numa publicidade… é o que leva ao consumismo, certo? Acho que pode-se dizer, que é hora de se revisitar Andy Warhol e a cultura Pop, uma das funções da arte é observar e interferir na sociedade.

OutraCoisa: Você vê possibilidade de coexistência entre consciência ambiental e tecnologia?

Vejo, desde que a força seja contrária. Não é que eu pense no “involuir”, não, é possivel evoluir, com reaproveitamento e troca de peças, com os fabricantes investindo em componentes mais duráveis e as pessoas exigindo isso ao invés de correr para o mais avançado dos modelos, sem sequer pensar no que será feito com o que usava antes.

Talvez pareça utópico, acreditar que tais coisas cheguem a mudar. Mas acredito que dentre as mudanças que precisam ser feitas, existe a fundamental e esta, está muito mais ligada à educação, que a qualquer outra coisa, pois, “Uma pessoa educada é por consequência, consciente.” E assim, convive bem, seja com o que for. A maior prova de que consciência ambiental pode gerar lucros ou diminuir custos são as latinhas de refri e cerveja e o vidro como um todo… até associações se criaram para “catar” o descarte e fazer esse material voltar de forma economicamente viável para o mercado. Com o lixo digital já está sendo feito um trabalho nesse sentido com a recilcagem das partes plásticas dos monitores e com a estrutura de metal das CPUs.

OutraCoisa: Quais seus projetos para o futuro da sua Arte?

Seguir incansavelmente!